AS MALDITAS !… – CAP. 04
Eu tenho horror a ELAS. Milhões, talvez bilhões de mulheres estejam comigo nessa alta tensão, mas há homens também. Um ou outro AS mata pura e simplesmente, ainda mais se estiver em plena exibição da condição de macho alfa diante da donzela aterrorizada. Mas que o medo DELAS é exclusivo do sexo feminino é balela.
Uma noite, recebi amigos e amigas para jantar em minha casa. Uma noite de verão. Lá estávamos acomodados na sala, em grande algazarra. Cada um mal podia esperar o outro terminar para contar uma história de autoria própria. As janelas da sala estavam escancaradas. Em meio a algazarra UMA entrou voando. Na época, ainda voavam como helicópteros com o rotor quebrado, não raro espatifavam-se nas paredes ou nas pessoas. Então, no meio da algazarra, só eu e um amigo percebemos a chegada abrupta. Disputamos quem sairia primeiro porta afora, do apartamento. Em segundos, estávamos eu e ele no corredor do prédio. E ainda tivemos o cuidado de fechar a porta com todas e todos bem trancados. De fora, gritávamos para alguém matar o monstro. Eu tenho um metro e sessenta arredondando generosa e descaradamente, mas esse meu amigo tem dois metros de altura e uma circunferência generosa. É um brutamontes. Lá pelas tantas gritaram que podíamos voltar. Do lado de fora, exigíamos garantias.
– Está morta? – meu amigo perguntou.
– Quero ver o corpo! – completei.
Tem que ver o corpo. ELAS se fingem de mortas, não esqueça nunca!…
Passados uns cinco minutos, desde que o terror entrou voando pela janela, os amigos e amigas dentro do apartamento nos convenceram a voltar. Abrimos a porta e entramos com cuidado.
– Onde está o corpo? – perguntei novamente.
– Na cozinha. – alguém respondeu.
– Quero ver.
Lá estava o corpo estendido no chão. Mas isso não garante nada.
– Alguém faz o favor de mexer NELA. Cutuca ELA! – pedi olhando à distância.
Alguém A cutucou e recutucou. Nenhuma reação. O que também não me convence.
– Por gentileza, alguém pega e despacha lá na lixeira do corredor do prédio… – pedi voltando a me acomodar no sofá.
Meu amigo de fé, irmão camarada e companheiro de terror, também voltou a se acomodar, os dois visivelmente estressados. Nada volta a ser como antes.
– Mas não é possível que um homem desse tamanho tenha medo DELAS! – alguém vomitou a provocação.
– Vou contar uma história. – disse meu amigo de fé, irmão camarada e companheiro de terror. – Certa noite eu estava num hotel mixuruca no interior do Nordeste. Estava exausto, tinha dirigido o dia todo para vender roupas. Estava acabado na cama. Aí eu vi Uma na parede. Assim que vi, ELA despencou pro chão. Abri a porta do quarto e gritei pra ver se aparecia alguém. Apareceu um sujeito franzino, esmirrado. O homem era uma espécie de zelador do hotel, um faz tudo dia e noite. Ele me olhou como quem pergunta: Por causa de quê esse homem tá gritando no meio da noite?… Aí, eu pedi: O senhor, por favor, mate AQUILO. Ele deu uma risadinha e disse: Êta, um homem do seu tamanho com medo Disso? Ainda mantendo o juízo, mas já começando a ficar aflito que com aquela conversa ELA se fugisse para aparecer depois, eu disse: DELA eu tenho medo sim, mas o senhor eu arrebento todinho… O homem parou de rir, matou a coisa e tirou o cadáver do quarto a meu pedido. Assim é.
Meu pai também se entregou numa noite. Ele tinha decidido dormir num colchonete no chão do quarto. Eu e minha irmã chegamos de madrugada e, ao nos arrastarmos silenciosamente pelo corredor, vimos Uma entrando por debaixo da porta. Bem grande. Grandes, mas com molejo e elasticidade para passar por debaixo das portas e das frestas mais mínimas. Abrimos a porta do quarto, a porta fez barulho, papai acordou irritado porque estávamos chegando tarde e já começava uma bronca.
– A gente só abriu a porta porque vimos UMA bem grande entrar aqui. – minha irmã explicou.
Papai levantou num salto. Resmungando, uma mistura de zanga por chegarmos tarde e de apreensão com ELA caminhando no mesmo chão em que ele estava dormindo. Papai levantou o colchonete, achou a intrusa e a matou.
– Mata direito senão ela sobe no colchonete… – preveni.
E nos retiramos rapidamente antes que a situação se acalmasse, papai recuperasse o juízo e começasse a bronca pelo adiantado da hora. E rimos muito relembrando a cena. Diga-se que papai era o típico homem que não levava desaforo para casa. Ái de quem mexesse com as filhas dele!… No entanto, tremeu diante DELA.
Penso que os homens são criados para não ter e/ou disfarçar os medos. Na minha família, as mulheres também foram criadas para serem bravas, guerreiras. Comigo, a criação falhou com Elas. Vovó não poupava esta frase comigo:
– Deixa de ser cagona!…