A história de Nuno – Capítulo VI
capítulo VI
Peguei as instruções para o voo. Era preciso chegar com mais antecedência no aeroporto para comprar a passagem do Nuno. Não tenho certeza se foram duzentos ou trezentos euros. Acho que foram duzentos. Achei caro, mas teria achado da mesma forma duzentos ou trezentos. Passagens na mão, despachei a minha bagagem e parti para a área de embarque dos animais. O veterinário me indicou um remédio para Nuno ficar calmo durante a viagem de avião, mas foi uma confusão tamanha na hora que não teve jeito, Nuno não aceitou engolir o comprimido. O funcionário encarregado de colocar os animais no avião tinha pressa. Nesse voo para o Brasil eram dois: o Nuno e um cachorro. E foi com o coração partido, mais uma vez, que vi a caixa com o meu Nuno na esteira a caminho do porão do avião.
– Fique tranquila, é climatizado. – me disse o comissário de bordo.
– Deixa eu ver como ele está? Eu sei que tem um elevador que desce para o porão, vi num filme. – tentei.
– Não é possível. – o comissário respondeu suavemente com um sorriso. – Mas ele está bem, fique sossegada.
Fazer o quê? Mas, ficar sossegada? Além do meu pavor a aviões, nesse voo ainda passei dez horas imaginando o Nuno assustado, se debatendo para sair da caixa, se debatendo para sair do avião!… Um voo diurno. Deus meu, se nos voos noturnos não consigo dormir, imagina no diurno com o Nuno no porão?!… Se eu viajasse na classe econômica podia leva-lo comigo. Na caixa, mas perto do mim. Há um limite de animais no avião, mas é possível. Na classe executiva não. Depois dos cinquenta anos de idade, com a coluna torta desde os trinta, se tenho dinheiro para viajar na Executiva, viajo; se não tenho, não viajo, paciência. Na classe econômica, num voo de dez horas, não dá. E que dez horas…
No desembarque, disparei na frente dos outros passageiros. Há muito o que se caminhar no aeroporto do Rio de Janeiro e ainda tinha a fila para mostrar o passaporte na Polícia Federal. Quando consegui alcançar a esteira das malas, me sentia num curto circuito de ansiedade. Cadê o Nuno? Que medo encontrar o bichinho morto ou desmaiado na caixa.
– Os animais saem por ali. – me apontou um funcionário do aeroporto quando fui confirmar se estava esperando no lugar certo.
Deixei minha bagagem para pegar depois e fui na direção que o homem apontou. Lá estava a caixa do Nuno. Abri a porta e o bichinho me olhou assustado.
– Meu bichinho, me desculpa. Acabou. Vamos pra casa. – disse achando que era simples assim.
Não era. Faltava passarmos num departamento do aeroporto para mostrar o passaporte do Nuno com as vacinas, chip e o tal certificado de saúde.
– Pretende voltar com ele a Portugal? – o funcionário perguntou.
– Não, chega de aviões. – respondi com a mão dentro da caixa alisando o pelo do Nuno.
Minha irmã estava nos esperando no aeroporto. Não costumo dar esse trabalho a ninguém, mas eu estava com o Nuno. Tenho para mim que minha irmã também só aceitou a ida ao aeroporto, de boa vontade, por causa da novidade peluda.
– Você realmente se superou. – foi minha irmã ao encontrar a mim e a Nuno na saída do desembarque.
– Nem me fala. Não sei o que tenho na cabeça. Com certeza não é juízo.
Fomos para o estacionamento montar o esquema do carro. No saco que viajou dobrado na mala, na ida, vinha a bagagem do Nuno: a bandeja, os sacos de areia e ração e os potes de ração e água. Tudo montadinho no carro, menos o pote de água para não derramar com o sacode.
Chegamos a casa, na Barra da Tijuca, lá pelas onze horas da noite. Minha mãe devia estar dormindo há pelo menos duas horas, mas não, estava bem acordada a espera… do Nuno. À minha espera também, vá lá, mas a novidade era o Nuno. Ao ver o gato, mamãe sorriu e aí disse:
– Tu és maluca…
– Agora é tarde. Eu perguntei no telefone o que a senhora achava de eu trazer o gato. Não falou, agora é tarde. Ele aqui está. Cadê meu Ronnie?